Entrevistas
Sonia Penin
A diretora da Faculdade de Educação da USP fala sobre a capacitação de professores e o papel da instituição para a melhoria da qualidade de ensino no país, entre outros temas.
A professora Sonia Penin comanda um dos maiores e mais prestigiados centros de formação de professores do país, a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). Com a discussão crescente em torno da formação de professores -- hoje, muitas pesquisas atestam que a competência do mestre é determinante para o sucesso do aluno --, ela recorrentemente vê a instituição que dirige ser alvejada pelos críticos. Não raro, essas discussões causam mal-estar, como o episódio em que a secretária estadual da Educação de São Paulo, Maria Helena Guimarães, disse que os cursos eram ruins e por isso poderiam ser fechados. "Isso é leviano", diz Sonia, que acha equivocado atribuir aos cursos de formação inicial todas as dificuldades enfrentadas pelos professores.
Durante a entrevista à repórter Bruna Nicolielo, em sua sala, na Cidade Universitária, em São Paulo, ela comenta o incidente e defende a atual carga-horária do ensino da teoria, considerada excessiva por muitos especialistas. Também fala sobre o papel da USP para a melhoria do ensino no país e da importância dos cursos de formação continuada. "É neles que o professor vai ter contato com as mais novas metodologias e saber como aplicá-las na sala de aula".
1. Quais são as variáveis para ter uma Educação de qualidade?
Sonia Penin: A qualidade da Educação depende da qualidade dos professores e, claro, a qualidade dos professores depende de quanto um país investe em Educação e quanto ela é de fato importante, não mero discurso. Preparar os alunos nesse começo de século 21 é um desafio enorme, já que é preciso resolver problemas contemporâneos e sanar as deficiências que vem desde o século 19.
Sonia Penin: Uma formação de qualidade engloba vários aspectos. Passa pela atração e retenção dos profissionais talentosos, variável que depende da valorização da profissão e de políticas públicas de melhores salários
. Qual o papel da USP na melhoria da Educação nacional?
Sonia Penin: Temos uma responsabilidade muito grande, pois somos uma referência na área. Formamos professores que, muitas vezes, vão atuar em outras instituições, formando novos professores. Ao mesmo tempo, nenhuma instituição sozinha dará conta do problema brasileiro. A USP deve ser capaz de formar bons educadores e produzir conhecimento sobre a problemática educacional. Nossa produção é muito intensa, mas não é suficiente para responder a todas as necessidades da Educação do país. Desde 2002, trabalhamos em um novo programa para formação de todas as licenciaturas a fim de integrar questões práticas e de conteúdo. Hoje, há maior articulação entre professores da Faculdade de Educação e de outras faculdades da USP
. Qual a importância do estágio na formação de um professor?
Sonia Penin: O estágio tem peso muito importante na formação, pois o aluno se depara com desafios concretos e isso é fundamental para a aprendizagem. O que seria da medicina se não houvesse aulas práticas? É ela que dá sentido à teoria. E ambas precisam andar conjuntamente. Na USP, estamos tentando fazer isso ao longo do curso e não só no finalzinho. A prática no curso de pedagogia é principalmente viabilizada pelos estágios, que, aqui, correspondem a 20% do currículo. Recentemente, fui a um encontro em Copenhagen, na Dinamarca, e uma questão muito discutida lá foi sobre como recepcionar os professores novos nas escolas. Os novatos precisariam acompanhar os professores mais experientes, assistir suas aulas por um bom tempo, a exemplo do que acontece em Cingapura.
. Muitos dizem que os cursos de formação de professores têm teoria demais. A senhora concorda?
Sonia Penin: A teoria é muito importante, desde que esteja voltada à resolução de problemas práticos. A secretária estadual de Educação de São Paulo, Maria Helena Guimarães, disse que os cursos, de tão ruins, deveriam ser fechados. Isso é leviano! Imputar aos cursos de formação inicial as dificuldades que os professores enfrentam hoje no ensino dos alunos das escolas de educação básica é inaceitável. Supor que um curso de formação profissional em nível superior deva tratar das reais demandas das escolas sem um embasamento teoricamente rigoroso é temerário. O trabalho está condenado ao fracasso ou à mediocridade se não se apoiar numa análise teórica e historicamente consistente. Teoria e prática, articuladas, definem uma boa profissionalização
6. Um professor sai da faculdade preparado para enfrentar a sala de aula?
Sonia Penin: Não. Um iniciante não dará conta de situações concretas. Por isso, a formação continuada é necessária. As faculdades precisam de novas diretrizes. As redes municipal e estadual de ensino precisam trabalhar em conjunto com as universidades. Assim, os alunos aprendem, nossos estudantes treinam e são orientados por professores daqui
7. O que um bom professor precisa ter?
Sonia Penin: Deve dominar fundamentos de toda ordem. Precisa ser autônomo intelectualmente, ter um pensamento lógico coerente -- é para isso que serve a teoria. Deve saber explorar todas as potencialidades cognitivas de seus alunos. Precisa saber resolver problemas, tomar as melhores decisões. Para ensinar bem, o educador tem que entender a especificidade do contexto em que está inserido, ou seja, conhecer bem a escola em que leciona, que tipo de gestão ela tem, seus alunos, a comunidade. Cada escola tem uma realidade distinta. O ensino para alunos da escola da favela de periferia é diferente do voltado para jovens de classe média, de uma escola da região central. O professor também deve saber preparar seus alunos para o momento em que vivemos, estar preparado para lidar com novas tecnologias, para trabalhar de forma dialógica com os estudantes, a fim de estimular a aprendizagem coletiva. Finalmente, deve dedicar-se a formação continuada. É nela que vai ter contato com as mais novas metodologias e saber como aplicá-las na sala de aula. A capacitação constante também vai ajudá-lo a resolver situações-problema da vida real
Sonia Penin: Se bem programados, os cursos à distância são uma alternativa. A Internet e as plataformas digitais diversas podem aproximam os estudantes, por meio de grupos de trabalho e conferências, apesar da distância. O Brasil é um país continental, mas dessa forma, podemos levar novos padrões de qualidade a áreas longínquas